Não me vou alongar quanto à minha opinião sobre a Daniela Martins, a mãe das gémeas brasileiras que foram salvas pelo contribuinte português cujo sistema nacional de saúde está de rastos. Compreendo que uma mãe faça tudo para tentar salvar os filhos. Mas não é aceitável que, na sua arrogância, depois de abusar dos portugueses, nos faça de mais parvos com as suas mentiras.

Vamos ao que verdadeiramente interessa neste triste caso. Muito mais grave que o comportamento de uma abusadora foi o comportamento dos que foram eleitos por nós para nos representarem. A obrigação destes é infinitamente maior do que a obrigação de uma estrangeira-muito-convenientemente-tornada-portuguesa, e proporcional à sua posição na hierarquia do estado, ocupando Marcelo Rebelo de Sousa a posição cimeira. Eu não tenho motivos para pensar que Marcelo Rebelo de Sousa alguma vez tenha sido corrompido por dinheiro ao estilo de Manuel Pinho. Mas, não consigo separar o caso das gémeas de outro caso que já tornava evidente a relação entre Marcelo Rebelo de Sousa e o Partido Socialista. É o caso do secretário de estado Hugo Mendes que pressionou a CEO da TAP a mudar o voo de Marcelo Rebelo de Sousa de Moçambique por ser mais conveniente para este último. A frase escrita pelo Hugo Mendes para justificar a pressão sobre Cristine Ourmières-Widener foi “É o nosso maior aliado mas pode tornar-se no nosso maior pesadelo”.

E porque é que não consigo separar os casos? Porque parece haver um padrão. E o padrão é que em ambos os casos, um titular de um alto cargo no estado, num governo do PS, no caso das gémeas Lacerda Sales, no caso da TAP, Hugo Soares, foi apanhado a abusar das suas funções para prestar um favor a Marcelo Rebelo de Sousa ou ao filho de Marcelo Rebelo de Sousa. Muito, muito grave.

Ficam algumas perguntas:

  • Estes são os dois únicos casos, ou foram os únicos casos que foram descobertos?

  • Tratou-se de um padrão constante durante toda a coabitação entre Marcelo Rebelo de Sousa e os governos de António Costa do Partido Socialista?

  • Quando Hugo Soares afirmou que Marcelo Rebelo de Sousa se poderia “tornar-se no nosso maior pesadelo”, qual seria o verdadeiro significado de se tornar o maior pesadelo? Seria uma guerrilha institucional à moda de Mário Soares versus Cavaco Silva? Ou seria tão somente Marcelo Rebelo de Sousa cumprir as funções a que tinha sido eleito como Presidente da República?

  • Um político tão sofisticado como Marcelo Rebelo de Sousa terá andado ingenuamente a ser beneficiário de favores feitos pelo Partido Socialista à conta do cidadão português, sem se aperceber de que era beneficiário desses favores, ou pelo contrário ter-se-á sentido motivado a retribuir noutra forma qualquer?

Há uma expressão usada pelos americanos que diz que “If it looks like a duck, swims like a duck, and quacks like a duck, then it probably is a duck.”. Não é preciso dizer mais nada, pois não?

Pode parecer que a minha maior preocupação é Marcelo Rebelo de Sousa, mas não é. É um actor em queda e no mínimo vai ter como castigo terminar o seu mandato como uma figura impopular, algo que imagino ser um dos seus maiores horrores. A minha maior preocupação é mesmo o Partido Socialista, o actor que continuará presente nesta dança por muitos mais anos e cuja propensão a subverter os balanços criados pela divisão de poderes institucionais em Portugal irá persistir qualquer que seja o próximo presidente da república.